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Bases de sustentabilidade do mercado de crédito imobiliário

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Há algum tempo temos insistido na divulgação de uma equação que acreditamos ser fundamental para garantir a sustentabilidade do mercado de crédito imobiliário

Bases de sustentabilidade do mercado de crédito imobiliárioSão componentes imprescindíveis, em nossa visão, os seguintes fatores:

  • Condições macroeconômicas favoráveis e, acima de tudo, inseridas no contexto de uma economia com estabilidade visível no longo prazo;
  • Marco regulatório consistente, que permita aos agentes econômicos avaliarem, com razoável previsibilidade, os riscos envolvidos no negócio;
  • Disponibilidade de recursos;
  • Qualidade do crédito originado, associado a um bom modelo de gestão/pós-venda.

Nos dos aspectos relacionados às condições da economia, um passado felizmente cada vez mais distante, ratifica uma frase de Mário H. Simonsen de que em um cenário de inflação de 2 dígitos nenhum modelo de financiamento de longo prazo fica de pé.

Durante o período de hiperinflação, não por acaso, as instituições financeiras, em se tratando de crédito imobiliário, se limitavam a cumprir as regras do Direcionamento Básico dos recursos do SBPE e, mesmo assim, se valendo de todos os artifícios técnicos e legais para aplicar o mínimo possível.

E isso se justificava, pois naquele cenário, aplicar recursos em crédito imobiliário não era um bom negócio.

Hoje vivenciamos uma situação totalmente diversa, em que as instituições financeiras competem para ampliar sua participação no mercado de crédito imobiliário, porém, nada disso estaria acontecendo se não fosse a volta da estabilidade econômica, a qual restabeleceu a confiança de investidores e consumidores.

A sensibilidade dos agentes econômicos quanto a este aspecto fica evidente, bastando verificarmos o comportamento dos bancos privados ao primeiro sinal de uma eventual crise global e ou desequilíbrios internos.

Do lado da demanda, embora essa reação não seja tão tempestiva, a manutenção prolongada de informações negativas em relação ao futuro da economia, mesmo que não consistentes, ou a real ocorrência de redução de níveis de emprego e renda, afeta a propensão dos consumidores em assumir compromissos de longo prazo, além de elevar o receio quanto ao comportamento do valor do imóvel e, no caso da perda de renda e emprego, esta afeta também o estoque do crédito, principalmente no mais relevante indicador da qualidade da carteira, ou seja, os índices de inadimplência.

Portanto, a variável ‘Condições Macroeconômicas Favoráveis’ deve estar permanentemente no ‘radar’ dos gestores e formuladores de estratégia para o mercado de crédito imobiliário.

Em relação ao Marco Regulatório, até há alguns anos, o risco jurídico era um dos principais componentes do spread bancário no Brasil.

Importantes avanços foram implementados:

  • Alienação Fiduciária,
  • Lei do Incontroverso,
  • Patrimônio de Afetação,
  • Permissão explicita para a Capitalização mensal de Juros,
  • Definição, em lei, do conceito matemático de Sistemas de Amortização e
  • Oficialização da Tabela Price como um sistema permitido no crédito imobiliário.

Esses avanços mitigaram o risco jurídico, porém, sem querer ser pessimista, ainda não foram testados em um cenário de instabilidade, principalmente em situação de perda de renda e emprego, situação em que o Poder Judiciário costuma ignorar leis e regras contratuais.

No entanto, seguramente o arcabouço jurídico atual está em condições muito mais favoráveis do que aquele vigente durante a ‘década perdida’.

No que diz respeito à disponibilidade de recursos, muito embora este fator ainda não tenha impactado negativamente o desenvolvimento do setor habitacional e ao mercado de crédito imobiliário, já passou, e muito, da hora de rompermos com a total dependência de crédito direcionado (Caderneta de Poupança e FGTS).

Não se trata de se buscar a substituição destas fontes de recursos, mas sim, de se valer de regras de mercado e construir modelos complementares, deixando essas duas fontes prioritariamente para financiar a produção de imóveis e se valer de alternativas de mercado para financiar a comercialização e o carregamento da carteira de crédito imobiliário.

Precisamos sair do discurso e ir para a prática, inclusive ampliando nosso conhecimento do mercado internacional e, assim, criarmos um modelo para alavancar a capacidade de obtenção de recursos, por exemplo, via Securitização, não necessariamente apenas pelo método convencional que conhecemos e, também, tirar do papel o arcabouço jurídico que torne possível a criação de um mercado de Covered Bonds.

Quanto à Qualidade do Crédito, esta se sustenta no tripé:

a) Análise de risco do tomador;

b) Critérios de comprovação de renda;

c) Técnicas de avaliação do imóvel, tanto em termos de valor quanto de qualidade.

Neste particular, vale algumas considerações:

  • A ‘garantia real’ mais importante é a capacidade e vontade de o devedor pagar o financiamento. O imóvel é garantia ‘assessória’.
    • Isso se garante com um bom sistema de análise de risco de crédito e, felizmente, no nosso caso, temos um sistema/modelo que é referência nacional.
  • A comprovação da renda – ter critérios normativos e sistemas que mitiguem o risco de fraude é decisivo para mitigar os riscos, principalmente da chamada ‘comercialização laranja’.
    • Vale lembrar que, a partir de 30.09.13, o BACEN determinou que as Instituições Financeiras mantenham, durante todo o período de vigência do contrato, os documentos que utilizou para apurar a renda do tomador.
  • Quanto à avaliação do imóvel, o simples fato de ser a LTV (relação dívida/garantia) um dos principais fatores que levam o cliente, em momentos de dificuldades, a optar por pagar ou não pagar a dívida, dispensa maiores comentários sobre a importância deste item.
    • No entanto, cada vez mais fica claro que também temos que estar atentos à qualidade do imóvel que estamos financiando, não importa se trata de um imóvel em que financiamos a produção ou se apenas a aquisição, mesmo que de imóvel usado.

No quesito Qualidade do Crédito, os 3 itens ora destacados são absolutamente indelegáveis, ou seja, devem ser mantidos necessariamente sob a gestão da Instituição Financeira.

Teotonio Costa Rezende

Diretor de Habitação da Caixa Econômica Federal

Mestre em Gestão e Estratégia de Negócios e graduado em Economia, Ciências Contábeis e Administração de Empresas

Atua no setor financeiro há quase 40 anos, 34 dos quais dedicado ao setor habitacional.

Veja mais:

Programa Minha Casa Minha Vida – Esclarecimento aos compradores

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